terça-feira, 23 de março de 2010

Amor aos Pedaços

*por Gerson Balione
Jucelino e Janilene se conheceram num boteco, a beira da estrada. Eram bóias frias. Ele, dezenove anos, ela, dezessete. Foi amor à primeira vista. A primeira transa foi no meio do canavial. Os dois saíram de lá, arranhados, pelas folhas cortantes da cana. Dois meses depois estavam casados. Cinco anos depois, Jucelino apareceu com uma mancha, avermelhada, na perna, depois duas e três. Seis meses depois Janilene também apareceu com as manchas.

— Isso deve ser cobreiro. — disse Jucelino.

E para a benzedeira foram.

— Isso é lepra. Não vou mexer nisso. — disse a benzedeira.

— Lepra nada, é só cobreiro. — disse Jucelino furioso.


Mas as coisas começaram a piorar quando o dedo mindinho de Jucelino caiu, enquanto cortava a unha. Mas sabe como é, pessoas do interiorzão, não querem saber de médico. Colocou fumo no local e pronto.

A situação ficou ainda pior, quando Janilene, depois de colocar o brinco, viu ele cair com a orelha e tudo. Mas o amor entre eles era tudo e não se abalaram com esses pequenos detalhes. Qual o problema dele não ter um dedinho, ela uma orelha e os dois um monte de manchas espalhadas pelo corpo.

Uma noite estavam fazendo amor e em meio a movimentos frenéticos, de vai e vem, o falo de Jucelino se soltou, fazendo aquele som de rolha pulando da garrafa, e rolou para debaixo da cama. Aquilo acabou com Jucelino, que aos prantos, foi até a mercearia comprar um tubo de cola tudo.

— Olha Jani! Acho que ficou melhor que antes, num ficou não? Só que eu vou ter que ficar com esta fita isolante aqui, até secar. — ele aproveitou e endireitou seu falo, que era meio tortuoso.

Na noite seguinte foram testar para ver se estava tudo bem. E não é que o negócio colou mesmo. Transaram bastante, até que, os dois peitos de Janilene, no sobe e desse, não subiram junto com ela, ficaram nas mãos de Jucelino. Lá vão eles, comprar outro tubo de cola tudo, na mercearia.

— Põem eles um pouquinho mais pra cima! — pediu Janilene ao marido.

— Um pouquinho?

— Tá bom vai, sobe eles, uns vinte e cinco centímetros acima do umbigo.

— Agora sim! Ó, ficou jóinha, Jóinha, parece de modelo.

E foi assim, um pedaço caía ali, colava outro aqui e o amor foi desgastando-se, desfazendo-se. Já não transavam mais. A última vez que o pinto de Jucelino caiu, não teve como colar, não tinha mais lugar. Guardou num pote grande de palmito. Um dos peitos de Janilene, ficou fora de prumo e isso começou a minar a paciência do casal, que em um certo dia entraram em conflito.

— Olha só, eu não aguento mais catar pedaços seus pela casa. Estou cansada! — esbravejava ela, enquanto pedacinhos de seus lábios, eram lançados no ar, misturados a gotículas de saliva.

— É? E você! Com esse peito torto...

Jucelino levantou a mão, com o dedo indicador em riste, e, num movimento brusco, o dedo se soltou, saiu voando, acertando o olho de Janilene. Aos prantos, ela assoou o nariz e este saiu no lenço. Nervosa chutou com força, no meio das pernas de Jucelino. Seu pé saiu voando junto com as bolas dele. Com um pulo, Jucelino voou pra cima de Jani, mas suas pernas ficaram onde estavam, só seu tronco foi pra cima da moça, que gritou, mas ao abrir a boca, seu queixo caiu, deixando um enorme buraco em seu rosto. Rolaram no chão, e foram deixando pedaços de seus corpos, espalhados por todo lugar, até se desfazerem por completo.

Cinco dias depois...

— JÚ???... Janiii??????... Porta aberta? Não tem ninguém em casa? Iuhuuuuu!!!!! Tem alguém aqui? Nossa que sujeira é essa? Que cheiro de carniça. Há quanto tempo eu não venho aqui. Deve ter sido você né? Seu cachorro inútil! Deve ter fuçado no lixo, e agora está aí, escondido, em baixo do sofá. — a mulher resmungava enquanto recolhia os restos de carne podre e jogava-os na lata do lixo. — Onde será que eles foram? Argh!! Você matou algum bicho e trouxe para casa, né? Seu vira latas! — o cachorro roia um fêmur, sem dar atenção ao que a mulher falava.

domingo, 21 de março de 2010

Grafite

Ele já não saia na chuva há muitos anos. Pensando nos problemas, no amor perdido e que tanto o castigou, resolveu não correr da chuva. Se deixou levar...

Foi andando, da padaria para a sua casa. Sentindo a roupa grudando no corpo, a água escorrendo pelo corpo, refrescando o rosto e o espirito. Já podia começar a se sentir revigorado. Pensou em andar mais devagar, para aproveitar mais a chuva. Lembrou de quando era criança e corria na chuva, chutando poças e rolando na grama. Achou meio ridículo agora sair rolando na grama, mas disfarçadamente chutou algumas poças. Sorriu... Se sentiu livre...

Tirou o boné, abriu os braços e parou de andar... ergueu a cabeça com o sorriso estampado no rosto e....

ZAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAP!!!!

Tssssssssss.....

sábado, 20 de março de 2010

O Mito do Palmito

* por M. D. Amado

Ricardo é conhecido, dentre outras coisas, como um verdadeiro caninga, pão duro, mão fechada... E por isso, sempre corre atrás de promoções, preços baixos e produtos no atacado.

Ricardo viu um majestoso pote de palmitos, de 3kg, daqueles potes que você pode usar depois para armazenar, por exemplo, biscoitos (bolachas, para os paulistas). Seus olhinhos brilharam, fez contas, calculou o peso/preço dos potes pequenos e levou para casa.

Mas Ricardo também tem problemas com a leitura. É o tipo de pessoa que aluga um filme (quando aluga e não baixa da internet) olhando apenas a sinopse. Não lê resenhas, comentários ou algo do gênero. E com o advento do Twitter, Ricardo agora lê apenas os 144 primeiros caracteres de qualquer coisa, e isso inclui rótulos de majestosos potes de palmitos, de 3kg. Ricardo leu as primeiras informações, mas a partir do 145º caracter, vinha a informação de que o conteúdo do pote deveria ser consumido em até 48 horas, depois de aberto. Não continha conservantes.

Agora Ricardo tem à sua disposição 40 reais de botulismo em bolhas, grudadas nos palmitos. Mas pelo menos vai poder antecipar a compra de 3kg de biscoitos (bolachas para os paulistas) para armazenar no majestoso pote de palmitos com botulismo em bolhas.

Talvez ele fique bravo com esse post... Mas talvez nem fique sabendo do final da história, afinal de contas, passamos de 144 caracteres.

sábado, 13 de março de 2010

Minha sogra é um alien

* por Gerson Balione

Vou começar este relato com uma pergunta: Como seria a aparência de um alien?

Depende muito do planeta, constelação, galáxia e etc. Alguns podem ser multicoloridos, amorfos, disformes, multiformes, monocromáticos, políticos e outros que conheço por aí. E os que eu já vi. É isso mesmo! Já vi um, ao vivo, na minha frente. Eles já estão entre nós há um bom tempo. Esse papo de disco voador não existe. É tudo papo de americano. As espaçonaves deles são muito mais complexas do que simples discos voadores.

Vou fazer uma revelação. Minha sogra é hospedeira de um deles. É verdade, ela tem um nas costas, ela diz que é uma verruga, mas eu não acredito porque eu já o vi se mexendo.

Outro dia estávamos, eu e ela, sentados no sofá da sala. Estava um tédio, então eu decidi puxar assunto. — O que a senhora acha... — já comecei perguntando — ...quando a gente tem uma verruga, devemos ou não arrancá-la? — hesitei um pouco — Se fosse na senhora, a senhora arrancaria? Olhando-me com desconfiança, foi categórica na resposta. — Não! — Por que? Perguntei, ela foi categórica outra vez. — Elas dão sorte! — se eu tivesse uma verruga, pediria para o médico arrancar. — Ela me fuzilou com o olhar e falou que depois que apareceu uma verruga nela passou a ter sorte. Uma delas foi meu sogro ter partido dessa para a melhor, ou pior sei lá.

Outro dia eu a peguei conversando com a verruga, ou o alien. Estava se olhando no espelho dizendo. — Ninguém vai tirar você de mim... — Argh! Que nojo! Eu preferiria ter um filho zarolho, a ter um alien no corpo.

Acho bom todo mundo que tem sogra começar a reparar nelas. Porque é assim, todo mundo que tem, nunca repara. Você passa por elas e só as cumprimenta. Às vezes nem olha na cara dela. Eu sou igual.

Foi por acaso que eu descobri. Geralmente por elas estarem em suas casas, se acham no direito de irem ao banheiro com a porta aberta. Foi justamente neste momento que vi. Não sei o que foi pior o alien ou a minha sogra no banheiro. Só posso dizer que é assustador... Os dois... Minha sogra e o alien.

Olha só, se eu de repente desaparecer, podem contatar a NSA o exercito brasileiro, ou sei lá quem. O fato é que, na noite passada, fiz outra descoberta. Na verdade, a minha sogra... é a VERRUGA!!!!! O alien tomou a forma da minha sogra, e vice-versa. Eu acho que ele, ou ela, já está desconfiado, ou desconfiada, que eu sei de alguma coisa. Já estou orientando a minha filha, que tem dois aninhos, para que, se ela identificar qualquer coisa estranha com a avó dela, me avise. Eu não sei, acho que ela não entendeu muito bem sobre o que eu estava falando, mais ela concordou com a cabecinha e sorriu. Coisinha linda que é essa menina. O duro é convencer a mãe dela. Pode até parecer paranóia minha, mas eu estava fazendo carinho na minha esposa, e senti uma verruga perto da sua axila. Sabe aquelas que ficam meio soltas, dependuradas, balançando... então, não tive dúvidas, dei um puxão e a arranquei na hora. Ela me deu um tapa na cara e me chamou de louco. Estou achando que ela também foi abduzida. Será?! Vou observar pra ver se aparecem outras. Mas em uma coisa eu tenho que concordar, minha sogra ficou muito melhor na forma de verruga, até dá pra encarar agora.

O pior não é isso, minha sogra faz uma berinjela a parmegiana de outro “mundo”.

Vou colher mais informações e depois posto aqui... Bem, pelo menos até me descobrirem.

Se alguém souber de algo que esteja acontecendo com sua sogra, entre em contato. De repente podemos impedir uma invasão alienígena. Nunca é tarde. Mas tome cuidado elas são ardilosas.

sábado, 6 de março de 2010

O Coragyps atratus e a Lua

* Por M. D. Amado

Era uma agradável manhã de junho. Um domingo. Marcelo caminhava na orla da Lagoa da Pampulha junto com seu filho Bruno, quando uma cena lhe chamou a atenção. Quase 10 horas da manhã e a Lua ainda se mostrava preguiçosa no céu e curiosamente uma revoada de urubus girava diante dela. A inusitada imagem foi comentada por pai e filho que lamentaram não estarem com a câmera para registrar aquele momento. Mas o que nem de longe aqueles humanos imaginavam, era que uma dessas aves não estava preocupada com a carcaça a qual rodeavam.

O jovem Uóshito era o urubu mais novo de uma família de cinco filhotes. Seus irmãos eram Uéslei, Uílso, Uélito e Uálaci - sim, assim mesmo... Seu Ubaldo fez questão de registrá-los assim. Todos estavam com o bando, fazendo o ritual do roda e come. Mas Uóshito não participava dessa vez. Estava pousado sobre um galho seco de uma árvore quase morta, admirando a Lua, que ainda discutia com o Sol, que exigia sua saída de cena. Certa vez Uóshito confessou ao pai que sentia um grande amor por aquela moça grande e brilhante. Ubaldo caçoou do rapaz, dizendo-lhe ironicamente que ele nunca poderia namorar a Lua, porque eles eram bichos de hábitos diurnos, enquanto a Lua, exceto quando bebia um pouco demais e perdia a hora, era uma dama da noite. Mas Uóshito não se conformava. Queria muito namorar a Lua. Ficava imaginando quanto tempo levaria para voar até ela. Queria pousar em sua superfície e se aninhar no meio de suas crateras. E naquele dia tomou uma decisão: iria ao seu encontro.

Quando a noite veio e a família se recolheu ao lixão, o jovem apaixonado se escondeu atrás de um monte de caixas e esperou que seu pai dormisse. Respirou fundo, olhou para o céu estrelado e lá estava ela. Linda, cheia e brilhante. Uóshito jurou ter ouvido o seu chamado e seus olhos secos e sem vida se encheram de lágrimas. Abriu suas asas, que ainda não tinham atingido a envergadura máxima, mas que já contava com imponentes 80 centímetros entre uma ponta a outra, e alçou vôo. E não se importou se seu vôo tinha ou não tinha acento circunflexo. Apenas voou.

O vento gelado da noite batia em sua cabeça pelada e se espalhava por seu corpo negro. O brilho intenso de sua amada o encantava cada vez mais e lhe dava forças para não querer desistir. Ouviu um som familiar e pensou em tudo que estava deixando para trás. Talvez aquele fosse o som da despedida, pois naquela noite ele se tornaria namorado da Lua, custasse o que cus... VUOOOOOOOOOOOOOSSHHH!!!!

Ahhhhh... Pobre Uóshito... Tão novo e inocente. Displicente como todo adolescente. Nunca prestou atenção quando seu pai dizia para tomar cuidado com as grandes aves de aço, predadores não naturais dos Coragyps atratus.